PERCEPÇÃO DOS USUÁRIOS DE PLATAFORMAS DIGITAIS SOBRE POSSÍVEIS VÍNCULOS EMPREGATÍCIOS NO CENÁRIO DA UBERIZAÇÃO.

Autor(es): 

Clarissa Cícori Rodrigues - Orientador: Prof. Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho

Ano: 

2019

[INTRODUÇÃO] O Uber é uma empresa representativa do fenômeno da economia compartilhada, contexto em que novas formas de organização do trabalho desafiam as regulações trabalhistas vigentes (GAUTHIER: 2016, p. 14-16). Assim, constata-se a abertura de processos judiciais em que motoristas de aplicativos pleiteiam vínculo empregatício com uma empresa dona de plataforma. O presente estudo objetiva observar o ponto de vista dos motoristas que atualmente trabalham com aplicativos, como o Uber no Brasil, e verificar se existe divergência significativa de narrativa entre seus discursos enquanto trabalham com os apps e as alegações nos processos trabalhistas. Busca, por fim, discutir a necessidade de criação de um marco regulatório específico para novas forma de trabalho. [METODOLOGIA] Foi elaborada uma pesquisa qualitativa exploratória. Após a etapa de Revisão Bibliográfica e estudo de processos judiciais no Brasil e no exterior envolvendo o Uber, foi elaborado um questionário de entrevistas em profundidade. Depois, houve a Pesquisa de Campo, com realização de 18 entrevistas semiestruturadas, analisadas com base em parâmetros da CLT. Os participantes, em sua maioria, residem na cidade de São Paulo, SP, e municípios próximos, e são de ambos os sexos e de faixas etárias diversas. [RESULTADOS] A análise das entrevistas permitiu obter 5 principais resultados. (1) A liberdade de horário é vista como uma vantagem de se trabalhar com o Uber. Mesmo motoristas com longas jornadas de trabalho entendem isso como uma opção pessoal, não forçada pelo aplicativo. (2) A insatisfação com o trabalho com plataformas digitais parece comum nos que têm nele a principal fonte de renda, os quais, devido aos baixos ganhos, não usufruem tanto da flexibilidade de horários. (3) O sistema de avaliação por notas das plataformas gera divergências entre motoristas. Alguns sentem-se injustiçados em relação aos clientes, outros reputam o sistema como um fator benéfico, e outros ainda pensam que deveria haver mais controle. (4) Há motoristas que descrevem o Uber como oportunidade de trabalho digno, ao contrário de alegações encontradas nos casos judiciais. Entretanto, isso não é um ponto de consenso, dadas as reclamações sobre estresse, trânsito e insegurança. (5) As tarifas cobradas pelo Uber são vistas como excessivas, algo relacionado aos altos custos operacionais do serviço. Apesar disso, não foi possível comprovar que de fato essas tarifas são injustas. [CONCLUSÃO] Com base no presente estudo, não foi possível concluir que os motoristas sentem-se empregados pelas plataformas digitais durante a prestação de serviço, com base nos típicos elementos da relação de emprego, segundo a CLT. Foram estudados diretamente dois aspectos: (1) Continuidade: motoristas têm autonomia para desligar o aplicativo quando quiserem, sem que exista um compromisso com a empresa. (2) Subordinação: não houve consenso dos motoristas sobre o sistema de controle. Também foi possível estudar indiretamente outras três características da relação de emprego: (3) Alteridade: os riscos da atividade econômica atingem todas as partes envolvidas na prestação de serviço, sendo a maior parte dos custos operacionais de responsabilidade do motorista. (4) Onerosidade: os motoristas contam que pagam para utilizar os apps, e não o contrário. (5) Pessoalidade: parece estar presente na relação entre motoristas e Uber, pois o aplicativo requer cadastramento com documentos pessoais. Assim, com base em todas as informações apresentadas, não é possível concluir que os motoristas se sentem empregados durante a prestação de serviço. Portanto, esse estudo revela sua percepção sobre sua própria função na economia compartilhada, uma importante contribuição do ponto de vista sociológico e jurídico. Ademais, demonstra o impacto da judicialização dos conflitos, dadas as divergências em relação aos discursos dos processos judiciais.

Departamento: 

FSJ

Anexos: