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[INTRODUÇÃO] Em que pese a redução inédita, embora pequena, no total de presos brasileiros, que passou de 755,6 mil pessoas em 2020 para 746,8 mil em 2021, considerando a soma de todos os regimes, o Brasil permanece na terceira posição no ranking de países com a maior população prisional do mundo – lugar que ocupa desde 2015, quando ultrapassou a Rússia. No que diz respeito à quantidade de pessoas privadas de liberdade, especificamente nota-se variação semelhante: de 709,205 mil em 2020, caiu para 682,102 no ano seguinte. Além do elevado número de apenados, outro aspecto que chama atenção na discussão acerca do sistema prisional brasileiro é a predominância de um perfil específico, dentro do qual se enquadra a maior parte das pessoas privadas de liberdade: homens (97,01%), autodeclarados negros (pretos e pardos somam juntos 66,31%) de 18 a 29 anos (41,91%), com ensino fundamental incompleto (49,30%) e que respondem por crimes contra o patrimônio (38,65%). Nesse contexto, o presente trabalho dá seguimento à análise iniciada no ciclo 2019/2020 do PIBIC na pesquisa intitulada “Análise do pensamento eugenista e biologizante e seu impacto no brasil atual: o punitivismo efetivado no sistema criminal paulista” e, assim como essa, pretende observar como se reproduzem ainda atualmente, e de modo implícito, concepções de cunho eugenista no sistema penal estadual de São Paulo. De modo específico, o trabalho examina o tipo de decisão e a qualificação do réu para verificar seu grau de instrução a fim de averiguar se há mudança na postura do Poder Judiciário do Estado de São Paulo a depender da condição racial e socioeconômica do réu, utilizando como mensuradores os crimes típicos de cada grupo social: crimes de “colarinho branco”, de um lado; e “furto” e “furto qualificado”, de outro. [METODOLOGIA] Por meio de metodologia mista com triangulação de fontes, entre elas a análise estatística multivariada de 753 sentenças dos referidos delitos em primeira instância, bem como o grau de instrução dos acusados em cada processo que o permitiram essa visualização, comparou-se o tratamento dispensado pelos magistrados de primeira instância quando julgam ambos os crimes, demonstrar a existência de seletividade penal que tem como alvo um perfil previamente definido, com características físicas e socioeconômicas que remontam noções cientificamente superadas originadas da eugenia, tais como a ideia de “criminoso nato”, frequentemente utilizada como pretexto para criminalização da pobreza. [RESULTADOS] A regressão logística calculada a fim de apurar a probabilidade de condenação em razão do nível de escolaridade do réu não apresentou resultados significativos para essa última variável. [CONCLUSÃO] Embora os resultados para “grau de instrução” não sejam significativos, são consistentes com o esperado: o acusado de cometer crime de colarinho branco tem menor probabilidade de condenação do que o de furto e, além disso, a pessoa com maior grau de instrução tem menor probabilidade de condenação. Nesse sentido, o estudo elaborado previamente corrobora o entendimento de que, apesar de o viés “eugenista social” das decisões não apareça de forma explícita nos argumentos sob os quais se baseia, é possível identificá-lo pela análise comportamental dos juízes, pois o tratamento dispensado por estes ao julgarem crimes de colarinho branco e furto – infrações penais relacionadas, normalmente, a grupos que distinguem social, econômica e racialmente –, sugere a existência de noções pré concebidas e de cunho eugenista sobre um “tipo ideal” de criminoso, cujos delitos a ele atribuídos devem ser respondidos com pena privativa de liberdade, independentemente da gravidade dos atos.