As Elites Brasileiras são “Nacional-Dependentes”

Autor(es): 

Luiz Carlos Bresser-Pereira

Ano: 

2012

Artigo em Foco: Os Três Ciclos da Sociedade e do Estado
 
A elite brasileira alicerça-se numa ambiguidade: ao mesmo tempo que admira o que vem dos países ricos e despreza seu próprio povo, recebe suporte dentro das fronteiras do País – basicamente por meio de suas relações com o Estado e dos rendimentos de um grande mercado interno. Por isso, no ensaio “Os três ciclos da sociedade e do Estado”, publicado na revista Perspectivas, Luiz Carlos Bresser-Pereira, professor emérito da FGV-EAESP, define as elites burguesas, políticas e intelectuais do País como “nacional-dependentes”.
 
O lado “dependente” é fácil de detectar, e foi exaustivamente explorado pelas teorias da dependência que dominaram intelectualmente a economia brasileira nos anos 1970 e 1980. Há países com grau mais elevado de desenvolvimento econômico, tecnológico e institucional, argumenta Bresser-Pereira. “Tal superioridade, porém, não deveria levar à subordinação se as elites nacionais se dessem conta de que os interesses dos países ricos não são os dela”, diz o economista.
 
Mas há, também, muitos fatores que marcam o lado “nacional” das elites: o interesse dos empresários no mercado interno, a existência de um Estado para proteger os interesses das elites diante dos países ricos, um passado de lutas e a força da identidade cultural. 
 
Em certos momentos da história, a dependência das elites foi maior, como em 1964, por medo do comunismo, e em 1990, quando a ideologia neoliberal foi hegemônica. Em outros momentos, entretanto, as elites foram mais nacionalistas, como em boa parte do período entre 1930 e 1964 e após os anos 2000, porque o atendimento de seus interesses depende do desenvolvimento do País. Para Bresser-Pereira, quanto mais dependentes forem as elites nacionais, mais o Brasil ficará estagnado. E quanto mais nacionais, maior a probabilidade de o País alcançar um “ verdadeiro desenvolvimento.”
 
O último período dominado pela dependência, o dos anos 1990, fez com que o Brasil voltasse, por algum tempo, à condição semicolonial que tivera antes de 1930. A crônica instabilidade macroeconômica de então fez com que os capitalistas rentistas e o setor financeiro se aproveitassem da situação para garantir uma política de juros internos elevados, câmbio apreciado e forte dependência externa.
 
Para Bresser-Pereira, a política econômica adotada na época não era inevitável para combater os problemas do País. Ele refuta a ideia de que o crédito externo era necessário ao Brasil e acredita que esse pensamento fez com que as elites aceitassem, sem a devida crítica, as recomendações vindas dos credores, por meio das agências internacionais. Para garantir sua credibilidade, o País promoveu reformas e políticas que os próprios países que as recomendaram não adotaram quando estavam em estágio correspondente de desenvolvimento. Exemplo extremo da alienação nacional, segundo Bresser-Pereira, foi a permissão para que empresas estrangeiras recebessem rendas da operação de serviços públicos monopolistas, como os de energia elétrica, telefonia fixa e operação de estradas de rodagem.
 
Na visão do economista, “o capital se faz em casa”. Não adianta que venha de fora do País: o capital que entra no Brasil não se soma à poupança interna e ao investimento total, apenas aprecia o câmbio, promove a substituição da poupança interna pela externa e induz o aumento do consumo, em detrimento do investimento.
 
A partir do terceiro ano do governo Lula, houve uma importante mudança. Após reestabelecer a confiança dos mercados financeiros, o governo ganhou condições para a reconquista de autonomia nacional. De acordo com Bresser-Pereira, esse novo período, pendendo para o nacionalismo, foi marcado pelo apoio do BNDES à empresa nacional e por uma política distributiva baseada, principalmente, no aumento do salário mínimo e na expansão do Bolsa Família.
 
Apesar de não ter acontecido qualquer mudança com a taxa de câmbio, que continuou sobreapreciada, prejudicando a indústria nacional, a política distributiva criou mercado para fabricantes brasileiras. E houve uma queda substancial na taxa de juro real, sem que houvesse descontrole inflacionário.
 
Enquanto, nos anos 1980, a economia estagnou e, entre 1990 e 2005, cresceu a taxas em torno de 2%, entre 2006 e 2010, houve um crescimento perto de 4% ao ano. Mas, em 2011, a economia cresceu 2,7%, e nada indica que voltará aos 4% ao ano.
 
Para Bresser-Pereira, o discurso de Lula e Dilma tem sido mais distributivista do que nacionalista. Mas ele acredita que agora há espaço para um desenvolvimento mais completo, com o fortalecimento do Estado e a geração de condições para que as empresas nacionais sejam competitivas. No plano da política econômica, o economista enxerga a necessidade de correção das taxas de câmbio e de juros; no plano de repartição da renda, a continuidade da diminuição da desigualdade; e, no plano político, o fortalecimento do conceito de nação e de um projeto nacional de desenvolvimento.
 
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