Cursos Brasileiros de Administração: Filhos da Guerra Fria

Autor(es): 

Rafael Alcadipani da Silveira e Carlos Osmar Bertero

Ano: 

2013

Artigo em foco: Os EUA e a Exportação e a Expansão do Ensino de Management no Brasil nas Décadas de 1950 e 1960: os Cursos de Management na UFBA e na UFRGS
 
Atualmente, mais de 20% dos alunos brasileiros de graduação estão matriculados nos cerca de 2 mil cursos de Administração de Empresas existentes no País. Poucos estudos foram realizados com o intuito de entender as origens históricas de tal expansão. Entre eles, destacam-se os de Rafael Alcadipani e Carlos Osmar Bertero, professores da FGV-EAESP, os quais têm procurado compreender o papel do governo e de instituições dos Estados Unidos na disseminação do ensino do management no Brasil.
 
O management despontou no final do século XIX e início do século XX nos Estados Unidos, como um conjunto de técnicas e habilidades que valorizava a eficácia e a eficiência, pretendia-se politicamente neutro e partiu de escolas comerciais independentes para universidades. Entretanto, a investigação histórica de Alcadipani e Bertero revela que a visão norte-americana não era imparcial. Durante os anos de Guerra Fria, nas décadas de 1950 e 1960, a representação diplomática dos Estados Unidos, a Michigan State University (MSU) e a Fundação Ford (FF) formaram uma rede governo-universidade-fundação para exportar o ensino do management ao Brasil, com o objetivo de difundir os valores norte-americanos e estreitar as relações entre os dois países.
 
Isso ocorreu em um período político conturbado. No Brasil, entre 1953 e 1966, aconteceram o suicídio de Getulio Vargas, a renúncia de Jânio Quadros e a deposição de João Goulart. Excluindo o período de crescimento econômico no governo Juscelino, a economia brasileira teve problemas sérios, e a relação com os Estados Unidos passou por atritos. Documentos oficiais que fizeram parte da pesquisa dos professores da FGV-EAESP mostram que havia pressões expressivas para que os Estados Unidos fornecessem mais ajuda e cooperação ao Brasil.
 
Assim, a primeira instituição para a exportação e expansão do management no Brasil foi a representação diplomática dos Estados Unidos. Ela cumpriu o papel de municiar o governo dos Estados Unidos com informações sobre o Brasil e ainda serviu de suporte às operações da missão da MSU nos seus diferentes projetos.
 
A segunda instituição, a MSU, esteve envolvida em 150 projetos de cooperação técnica internacional em diferentes países do mundo, em inúmeras áreas do conhecimento. Havia nos Estados Unidos, nessa época, uma verdadeira indústria de cooperação internacional acadêmica, com muitos recursos disponíveis. Um dos projetos desenvolvidos no Brasil foi o da criação das escolas de management, que ocorreu entre 1953 e 1966. Envolveu a FGV-EAESP e as universidades federais da Bahia (UFBA) e do Rio Grande do Sul (UFRGS). Segundo o mais recente estudo de Alcadipani e Bertero, tal projeto custou o equivalente hoje a cerca de 10 milhões de dólares, e foi financiado pelo governo brasileiro e pela United States Agency for International Development (USAID).
 
A MSU teve a função de apoiar o desenvolvimento e expansão da capacidade de se ensinar management no Brasil, oferecendo expertise técnica. O artigo I do contrato entre a MSU e o governo dos Estados Unidos estabelecia com detalhes as funções da MSU em relação à FGV-EAESP e demais instituições de ensino de management no Brasil. Entre 1954 e 1958, 11 professores da MSU vieram ao País e aqui ficaram por aproximadamente dois anos. A maioria deles esteve na FGV-EAESP. Houve, ainda, professores na UFRGS e na UFBA, e no curso de Engenharia da Produção na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
 
A MSU tinha o papel de gerir todas as questões associadas à mudança e à manutenção dos professores. Isso envolvia, entre outras atividades, conseguir certificados de que os professores não tinham relações com comunistas. Todos os móveis, utensílios domésticos e até mesmo os carros dos professores eram enviados por navio. Os professores mantinham correspondência frequente com a MSU e reportavam suas atividades no Brasil.
 
A terceira instituição, a FF, entrou no projeto quando o ensino do management já tinha destaque no país e forneceu auxílio financeiro para se consolidar ainda mais a iniciativa, catalisando a expansão para outras áreas geográficas brasileiras.
 
O estudo de Alcadipani e Bertero contribui para a compreensão da formação do campo de Administração no Brasil, mostrando em detalhes como a representação dos Estados Unidos, a MSU e a FF formaram uma rede que permitiu a exportação e a expansão do management para o país, nas décadas de 1950 e 1960, não apenas no Sudeste, mas também em outras regiões.
 
Entre em contato com o professor Rafael Alcadipani da Silveira
 
Conheça as pesquisas realizadas pelo professor Rafael Alcadipani da Silveira