Como a Indústria Tabagista Utiliza os Pontos de Venda para Ações de Marketing

Autor(es): 

Inês Pereira

Ano: 

2011

Artigo em foco: Promoção de Cigarros no Varejo Paulistano
 
De acordo com o Instituto Nacional do Câncer, todos os anos 200 mil brasileiros morrem precocemente de doenças causadas pelo tabagismo. No mundo, estima-se que o cigarro será responsável pela morte de 6,4 milhões de pessoas em 2015, o equivalente a 10% do total de óbitos previstos, segundo estudo publicado na PLoS Med. Uma das principais recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para combater o tabagismo é a proibição de propagandas e promoções de cigarros. Entre as ações de marketing que devem ser banidas, a OMS inclui aquelas realizadas nos pontos de venda: displays, materiais promocionais e colocação do produto à vista dos consumidores.
 
No entanto, a legislação brasileira, atualmente, não coloca nenhuma restrição à exposição de maços de cigarros ou a promoções nos pontos de vendas, que se tornaram o principal alvo das iniciativas de divulgação da indústria tabagista. Como já comprovaram pesquisas internacionais, essas ações promocionais em lojas de conveniência, bares e mercearias têm se mostrado eficazes no incentivo ao consumo de cigarros, particularmente entre os jovens. Um estudo sobre o assunto com 2125 estudantes da Califórnia, publicado no American Journal of Public Health, revelou que o adolescente que frequenta pontos de vendas que recebem esse tipo de material promocional tem uma probabilidade 50% maior de vir a fumar alguma vez na vida.
 
Promoções em pontos de venda também dificultam o abandono do vício. Estudo publicado na Addiction constatou que, ao se depararem com displays de cigarros, 34% das pessoas que haviam tentado parar de fumar no último ano e 34% dos fumantes recentes sentiram-se tentados a comprar o produto. A mesma pesquisa revelou que uma em cada cinco pessoas que tentavam parar de fumar e uma em cada oito que haviam abandonado o cigarro recentemente procuravam evitar os pontos de venda onde usualmente compravam seus cigarros, como forma de evitar uma recaída. Cerca de um terço dos fumantes apontou que largar o vício seria mais fácil se a propaganda de cigarro fosse removida das lojas onde fazem suas compras.
 
Considerando a relevância do problema, a pesquisadora Inês Pereira, do Centro de Estudos GVsaúde, com o apoio da Aliança de Controle do Tabagismo (ACT), resolveu estudar as ações promocionais da indústria brasileira de tabaco nos pontos de venda. Em maio de 2010, ela coordenou um levantamento em 429 estabelecimentos comerciais espalhados pela cidade de São Paulo, 209 dos quais bares ou lanchonetes, 114 padarias e 106 bancas de jornais. Foram avaliados cinco tipos de variáveis: a localização dos cigarros e do conteúdo promocional (por exemplo, se próximos ao caixa ou às balas e doces), o tipo de material promocional (displays luminosos ou não, pôsteres, cartazes), a quantidade de promoções (apenas na área em que cigarros são expostos ou em outras áreas), a presença de outros artefatos (como relógios, bandeirolas, porta cestas de compras e venda casada de produtos com cigarros) e a comercialização de produtos similares (como cigarrilha, cachimbo, charuto, fumo de corda).
 
O estudo mostrou generalizada exposição de cigarros e materiais promocionais da indústria tabagista nos pontos de venda da cidade de São Paulo, principalmente nas padarias. Maços de cigarros estavam visíveis para o público adulto na quase totalidade dos estabelecimentos. Os cigarros também ficavam ao alcance da vista das crianças, sendo frequente sua localização perto de balas, chocolates e doces. Na maior parte dos pontos de venda, o material promocional estava na área em que os cigarros são expostos, sendo muito comum a exibição de displays de cigarros e de cartazes com os preços dos produtos.
 
Os resultados são parecidos com estudos similares feitos em várias partes no mundo e revelam que também no Brasil, representado por sua maior cidade, a indústria tabagista explora intensamente a oportunidade de divulgar seus produtos nos pontos de venda. “Tal conclusão é bastante preocupante”, diz a autora do estudo, Inês Pereira. Segundo a literatura sobre o tema, esse tipo de promoção irrestrita nos pontos de venda traz a percepção de que cigarros são seguros para consumo e aceitos socialmente, o que afeta particularmente crianças e adolescentes. Também torna os frequentadores de padarias, bares, lanchonetes e bancas de jornais mais suscetíveis a se interessar por fumar e dificulta àqueles que consomem cigarros largarem o vício.
 
Diversos estudos mostram os problemas de saúde pública relacionados à ação promocional da indústria tabagista. A evidência de que no Brasil há presença maciça de cigarros e material de promoção nos pontos de venda reforça a necessidade de se implementar no país as recomendações da OMS, de acordo com Inês Pereira. “As ações promocionais da indústria do tabaco nos pontos de venda realmente funcionam. Portanto, para controlar o tabagismo e promover a saúde pública, é muito importante que esse tipo de ação seja severamente restrito”, afirma ela.  
 
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Conheça as pesquisas realizadas pela professora Inês Pereira.