A Arena Política das Grandes Obras do Governo

Autor(es): 

Maria Rita Loureiro, Marco Antonio Teixeira e Alberto Ferreira

Ano: 

2013

Artigo em foco: Democracia e Desenvolvimento no Brasil Contemporâneo: Conflitos e Articulação de Interesses no Projeto São Francisco 
 
Diferentemente do que ocorreu em grandes obras realizadas pelos governos militares, como Itaipu e Sobradinho, atualmente grandes projetos não são implantados sem a participação de diversos atores dos poderes políticos, da burocracia governamental e da sociedade civil. No artigo “Democracia e desenvolvimento no Brasil contemporâneo: conflitos e articulação de interesses no projeto São Francisco”, os pesquisadores da FGV-EAESP Maria Rita Loureiro, Marco Antonio Teixeira e Alberto Ferreira analisam como ocorre tal processo, com base no estudo do projeto de transposição do rio São Francisco.
 
Esse projeto está na agenda pública do País há mais de um século e sempre foi objeto de disputas. Historicamente, houve coalizões favoráveis à transposição, compostas essencialmente por técnicos governamentais, ministros de Estado e líderes políticos dos Estados beneficiários do projeto (Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Paraíba). Houve também coalizões contrárias ao projeto, compostas por líderes políticos dos Estados potencialmente prejudicados com a transposição (Bahia, Minas Gerais, Sergipe e Alagoas), além de grupos econômicos ligados à irrigação e geração de energia elétrica, movimentos organizados da sociedade civil, acadêmicos, instituições religiosas e juízes.
 
Ao ser transformado em prioridade do governo e incorporado no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o projeto finalmente saiu do papel, mas o nível de execução ficou, até o momento da pesquisa, abaixo de 70% do planejado. Para Loureiro, Teixeira e Ferreira, isso aconteceu não apenas por problemas técnicos mas também como reflexo das contestações judiciais impetradas pelo Ministério Público e organizações da sociedade civil, e em função das auditorias e fiscalizações realizadas pelos órgãos de controle. “Ou seja, diferentemente do que a imprensa propaga, o atraso na execução de grandes empreendimentos nem sempre está associado apenas a uma suposta ineficiência governamental, mas, ao contrário, ao funcionamento das instituições democráticas de controle”, afirmam.
 
De acordo com os pesquisadores, no projeto de transposição do rio São Francisco, estabeleceu-se “um possível novo padrão de relação entre Estado e sociedade”. Ainda persistiram “velhas gramáticas políticas do clientelismo”, como a incorporação ao projeto de obras demandadas por representantes dos Estados potencialmente prejudicados e a atribuição de cargos a líderes opositores à obra. Entretanto, as relações também se pautaram pelo maior compartilhamento de decisões, com arranjos de formulação e implantação mais participativos.
 
Assim, a obra foi rebatizada como Projeto de Integração, visando não só à transferência de água para o semiárido como também à revitalização da bacia do rio São Francisco e de outros programas destinados a melhorar as condições econômicas para grupos sociais que seriam prejudicados caso a política contemplasse apenas a transposição.
 
Esse processo trouxe desafios para os gestores, apontam Loureiro, Teixeira e Ferreira, exigindo-lhes, além de capacitação técnica e administrativa, habilidades políticas de articulação de interesses e de construção de consensos. “A implantação do projeto do Rio São Francisco tornou-se um processo bastante politizado, uma vez que se procurou neutralizar ou recuperar perdas políticas ocorridas no momento da formulação, transformando frequentemente as agências burocráticas em loci de representação de interesses”, observam os pesquisadores.
 
Para os autores do estudo, isso demonstra, por um lado, a fragilidade institucional dos partidos políticos na construção e articulação de projetos para a Nação e, do outro, em contraste, o papel de destaque desempenhado pelas burocracias estatais, hoje, nas políticas públicas. Essa politização do processo ocorre nos órgãos que implantam as políticas e naqueles responsáveis pelo controle, que, ao exigirem ajustes no projeto, criam a necessidade de negociação para superar os entraves operacionais.
 
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